A deputada estadual Ana Lucia Menezes (PT) alertou aos colegas hoje, em discurso acompanhado por representantes do Sintese, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e da Igreja Católica, que sofreu ameaças de morte por causa de sua luta em favor do movimento quilombola na região do Baixo São Francisco. A parlamentar disse que o caso já está sendo investigado pela Secretaria de Segurança Pública (SSP) e pela Polícia Federal.
De acordo com a deputada petista, oito integrantes do movimento quilombola também estão sendo alvos de ameaças de morte no baixo São Francisco, onde atuam. Ana Lucia afirmou que essas ameaças mostram a luta pela terra naquela região, e revela o poder das elites. “Um fazendeiro disse no Ministério Público que ou se resolve a questão ou haverá derramamento de sangue”.
Diante de galerias lotadas por moradores da região onde ocorre o conflito, Ana Lucia lembrou que os governos Marcelo Deda e Dilma Rousseff foram conquistados para garantir cidadania e segurança às populações marginalizadas e que oitenta por cento das terras do conflito pertencem à União. “Ninguém tem a propriedade daquelas terras, formadas por brejos, várzeas, rios. Os negros fugiam (dos coronéis) para lugares difíceis como aqueles”, narrou a deputada, lembrando da existência de antigos quilombos naquela área.
“Companheiros de outros quilombos têm sido ameaçados constantemente”, disse a deputada, afirmando que está de posse de relatórios que foram encaminhados ao Ministério dos Direitos Humanos e à comissão que ouviu, em Sergipe, membros do movimento quilombola. Ana Lucia declarou que está sendo acompanhada, no caso, pelas polícias Federal e Civil (do Estado). “A situação de Sergipe não é diferente do Pará ou de outras áreas”, observou.
Ana Lucia disse ainda em seu discurso que o Ministério Público Federal tem papel importante para mediar o conflito e fornecer garantias de segurança aos envolvidos. “Quem tem terras, quem tem dinheiro, quer a propriedade só para si e explora os trabalhadores”, argumentou. A deputada lamentou a situação e lembrou o fato do país estar vivendo um longo período de democracia. “Acompanho há muitos anos a luta dos sem terra e na luta quilombola há também uma luta pela terra onde moram. Ao longo da vida eles se apropriam da terra que foram dos ancestrais”.
“Rendo homenagens a essas oito lideranças que resistem em povoados que sequer têm luz. Essas mulheres e homens têm coragem de enfrentar a elite, os jagunços, enfrentar a pistolagem. Veem homens armados e lutam sem nada, só com a coragem”, citou. A deputada disse que não vai aceitar que corra sangue em Sergipe por causa da desapropriação de um bem que pertence ao povo. “Ou esse país faz reforma agrária ou nós não vamos resolver os problemas básicos da população. Precisamos resolver com coragem estes problemas, promover a educação, a saúde e os direitos fundamentais”, destacou a deputada.
Para Ana Lucia, as ameaças de morte têm que ser levadas à sério e apuradas pelas autoridades. “Essas ameaças não são brincadeiras, tenho relatórios, depoimentos. Meu mandato incomoda aos poderosos. Nunca pensei que fossem tão graves as ameaças quando se trata de luta pela terra e pela questão ambiental”, argumentou. Segundo ela, os quilombolas vão conquistar a posse da terra, produzir e “melhorar sua qualidade de vida sem derramar sangue. Essa é a vontade política dos governos de Déda e Dilma Rousseff”.
O deputado estadual e líder do MST, João Daniel, disse que o mandato de Ana Lucia tem sido fundamental para garantir o apoio às classes marginalizadas e reforça a luta dos povos quilombolas que luta há tantos anos. “Sou solidário e estou à disposição para atuar junto ao povo do baixo São Francisco”.
A deputada estadual Maria Mendonça lamentou as ameaças de morte sofridas pela colega e afirmou que fatos dessa natureza são inaceitáveis. “Sou solidária à luta dos quilombolas. É lamentável. Passamos por um período em que a democracia é plena e garante o exercício pleno da cidadania. Vejo um depoimento consistente, forte, determinado, e mais uma vez presto minha irrestrita solidariedade”.
O líder da bancada de oposição, deputado estadual Venâncio Fonseca, também prestou solidariedade à Ana Lucia e lembrou que a colega tem um trabalho importante na área educacional, como também na defesa dos quilombolas. Segundo ele, Ana Lucia ocupou a pasta da assistência social onde executou um grande trabalho. “Me coloco à disposição como presidente da Comissão de Direitos Humanos. A desigualdade existe em todo o país, na distribuição de terras, até na área política. Vossa excelência foi injustiçada em seu partido”, lembrou.
Para o líder do governo, deputado estadual Francisco Gualberto, quando se fala dos quilombolas do baixo São Francisco se fala de terras que serão indenizadas. “Espero que todos que estejam envolvidos nessa frente (autores das ameaças) sejam chamados em garantia da proteção dos quilombolas. Quando alguém recebe a ameaça de morte vem o prejuízo de não poder ir onde quiser, por isso repudio com veemência essas ameaças”.
Gualberto afirma que atitudes como a tomada por empresários contra a deputada não cabem mais num país democrático como o Brasil. “Essas pessoas deveriam rever essas atitudes, essa postura. O Estado está olhando essa situação, muitas instituições estão observando essa situação”, comentou o líder do governo.
“Estou estarrecido”, afirmou o deputado estadual Zé Franco, que destacou o fato dos deputados serem eleitos pelo voto popular para defender os interesses da população, a exemplo das comunidades quilombolas. O parlamentar acredita que as ameaças dirigidas à deputada Ana Lucia atingem a todo o parlamento. “Me sinto constrangido, não podemos mais aceitar isso”.
Evitando festas
Ana Lúcia encerrou seu discurso afirmando aos colegas que sua maior preocupação, no momento, é com sua exposição em locais onde pode estar vulnerável. A parlamentar destacou as recomendações da polícia para evitar aglomerações e não se expor. “Não vou poder ir ao desfile do (bloco de Carnaval) Rasgadinho por causa da orientação dos policiais. Tomarei cuidados, pois não quero que os policiais fiquem a minha disposição. Quero proteção quando for para a área de conflito”. A deputada disse que desde 1979, quando iniciou sua militância, não havia recebido ameaças. “Todas as instâncias do poder sabem de onde partiram as ameaças”, finalizou.
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