terça-feira, 29 de setembro de 2009

INADIMPLÊNCIA DE PESSOA FÍSICA AUMENTA COM A EXPANSÃO DAS OPERAÇÕES NO CARTÃO DE CRÉDITO.

A taxa média cobrada pelas administradoras de cartões de crédito chegou a 237,93% ao ano no mês de julho, constituindo-se nos juros mais altos do mercado, de acordo com levantamento da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac).

Apesar disso, tem crescido ininterruptamente o volume de operações com uso do cartão de crédito. Essas operações representam, hoje, cerca de 25% de todas as movimentações creditícias do mercado. Somaram nada menos que R$ 14,566 bilhões no mês de julho, de acordo com números do Banco Central. Os dados referentes a agosto serão divulgados amanhã (29).

Houve aumento de 15,4% nas operações com dinheiro de papel em relação a junho, enquanto outras modalidades de crédito com juros menores foram menos procuradas. Casos do cheque especial, com juros anuais de 167,3% naquele mês, operação que recuou 1% no volume total, ou do crédito pessoal, com juros de 44,8%, com recuo de 0,2%.

O BC mostra também que o saldo acumulado das dívidas de pessoas físicas, feitas com cartão de crédito, somava R$ 26,491 bilhões em 31 de julho. Do total, R$ 9,36 bilhões (28,3%) eram dívidas vencidas há mais de 90 dias, o que tecnicamente é considerado inadimplência.

Nesse ponto, os comerciantes começam a se inquietar com a “perda no nível de qualidade do endividamento das famílias”, segundo o economista da Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomércio), Altamiro Carvalho.

Ele acredita que o aumento da inadimplência está diretamente relacionado ao aumento dos prazos para pagamento das faturas do cartão de crédito. O prazo, historicamente, sempre foi de 30 dias, mas, na média dos primeiros sete meses deste ano, passou para 53 dias, com expansão para 62 dias nos meses de junho e julho.

Essa dilatação abrupta do prazo de financiamento pode ser determinante, segundo ele, para o aumento da inadimplência. Mas não é só a questão de prazo maior, como diz o economista Pedro Vartanian, da Trevisan Escola de Negócios.

Vartanian assegura que o crescimento das operações com cartão de crédito decorre do aumento no número de estabelecimentos que aceitam essa modalidade de pagamento, além da comodidade e da segurança nas operações. Ele lembrou também que o custo da anuidade do cartão tem caído e alguns clientes são, inclusive, liberados desse ônus.

O consultor da Trevisan diz que a taxa de juros é realmente alta, comparada a outras modalidades, mas ressalta que “quem utiliza o cartão e quita a fatura no prazo não paga juros. Por esse motivo, o aumento das operações com cartão não sofre o impacto direto da taxa de juros”.

Já o pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Mário Rubens diverge dessa visão. Ele diz que o cartão de crédito é utilizado pelas classes menos favorecidas como complementação de renda, em grande parte indiferentes ao comportamento das taxas de juros e mais atentas ao tamanho do crédito rotativo.

Rubens acha que a expansão da inadimplência é também efeito da crise financeira mundial e do desemprego. Ele acredita, porém, que, em decorrência dos sinais de recuperação econômica, “esse problema deve ser transitório” e lembra que os dados de julho sobre créditos com recursos livres trouxeram redução na taxa geral de inadimplência para pessoas físicas.

Enquanto isso, o presidente do Instituto DiSOP de Educação Financeira, Reinaldo Domingos, considera que a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) nas compras de eletrodomésticos, material de construção e automóveis também teve efeito substancial no aumento das operações com cartão de crédito.

Segundo ele, a redução de IPI teve mais impacto do que o apelo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, feito no final do ano passado, pedindo para o povo comprar e garantir o consumo doméstico, de modo a ajudar o país a enfrentar a crise financeira externa, que se alastrou sobre a economia real brasileira a partir de outubro do ano passado.

Domingos entende que o consumidor viu na redução do IPI o consequente barateamento dos produtos que desejava e uma “oportunidade única de adquirir esses bens”. Como a redução era por tempo limitado, em vez de poupar para comprar à vista, muitos consumidores fizeram compras parceladas no cartão.

Reinaldo Domingos considera positivo o uso do cartão, mas manifesta preocupação quanto às “taxas exorbitantes de juros”, que fazem com que o consumidor que não consiga pagar o total das dívidas mensais “caminhe rapidamente para a inadimplência, cuja volta é muito complicada”.

O problema maior, afirma, não está apenas no fato de parcelar as dívidas e, sim, na falta de educação financeira da população. Isso faz com que as pessoas não incluam, muitas vezes, os valores das parcelas das compras no cartão em seu orçamento, segundo o professor.

Ele ressalta que “se medidas referentes à educação financeira não forem adotadas rapidamente, temo que, num futuro próximo, tenhamos uma situação crítica no país, com milhões de endividados e sem condição de sair dessa situação”.

Fonte: Agência Brasil (Stênio Ribeiro e Kelly Oliveira)

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